Como ser neutro se acabou de chover e a terra cheira
e o asfalto cheira
e as árvores estão lavadas com suas folhas
e seus galhos
existindo?
Como ser neutro, fazer
um poema neutro
se há uma ditadura no país
e eu estou infeliz?
(Ferreira Gullar)
Sejamos sinceros: seria mais fácil desacreditar. Desesperançar-se de que ainda há espaço para um jornalismo que preze por um olhar humano e um conteúdo aprofundado. Mas o mundo arde e a verdade é que não mantemos muito apego às felicidades. Acreditamos que há lugar para a grande reportagem, para a produção de ensaios e narrativas documentais que estejam ligadas às novas formas midiáticas de informar. Acreditamos ainda mais na poesia. É por isso que nascemos como um laboratório: nos concedemos o direito de experimentar novas maneiras de contar histórias.
Das ilusões que inventaram, a máscara da neutralidade não nos convence. Desde falácia, nos declaramos contra. Viver não é neutro. Como ser neutro se choveu e a terra tem esse cheiro bom, se eu estou infeliz, se a música que toca é alegre, se uma criança chora de doença? Longe da neutralidade, deixamos claros os nossos princípios:
Seria mais fácil desacreditar.
Anú, o pássaro que nos inspira, é artista.
Ele é conhecido por reproduzir o canto de outras
aves. Assim, espalha essas canções ao vento
para que cheguem a lugares onde nunca
ecoariam. Nossa atuação busca vozes
deixadas ao esquecimento, tenta fazer
com que sejam escutadas as melodias
de gentes que tão pouco são ouvidas.
Seria mais fácil desacreditar,
mas este é o nosso manifesto:
insistimos em querer
espalhar uma infinidade
de cantos ao vento.