Olimpíadas e Remoções: Vila Autódromo
As lembranças das moradoras, de ruas calmas com abundância de árvores frutíferas e crianças brincando, hoje da lugar a um cenário de pós-guerra
A paisagem é da praia da barra, condomínios de luxo, shopping center, as imponentes estruturas dos Jogos Olímpicos e, em seguida, muros que avisam: “Nem todos têm um preço” e “Não vamos sair!”. É o pouco que sobrou da Vila Autódromo que ainda resiste à ameaça de uma remoção coletiva por conta das obras do Parque Olímpico, vizinho da comunidade. Comunidades inteiras têm sido removidas pelos governos, interessados em afastar a pobreza do turismo e da mídia internacional que acompanha os megaeventos.
Localizada na Barra da Tijuca, zona norte do Rio de Janeiro, a Vila Autódromo sofre com a ameaça de despejo desde o final de 2013. Das 600 famílias que viviam no lugar, hoje resistem apenas 20. Moradores foram obrigados a deixar suas casas sem a certeza de onde iriam morar. Outros teriam recebido garantia de que não seriam removidos, e sofreram o despejo da mesma forma. Sandra Maria, moradora há 25 anos, conta ter sofrido ameaças por funcionários da prefeitura, “Vocês vão sair por amor ou pela dor”.
As lembranças das moradoras, de ruas calmas com abundância de árvores frutíferas e crianças brincando, hoje da lugar a um cenário de pós-guerra. Os escombros de casas demolidas permanecem no lugar, contrariando a ordem oficial de que sejam retirados no máximo até 5 dias após a demolição. A fiação elétrica é interrompida em muitos locais e apenas um tapume de alumínio separa o que restou da Vila das enormes máquinas de construção que erguem, logo ao lado, a estrutura para receber o megaevento deste ano. No local da comunidade seriam construídas vias de acesso ao Parque Olímpico.
A concessão de uso foi dado por dois governos, e mais recentemente, através da lei complementar 74, a área foi declarada uma AEIS — área especial de interesse social para fim de moradia. Além disso, aceitando um desafio do prefeito Eduardo Paes, as e os moradores construíram, com apoio de técnicos da UFF e UFRJ, um Plano Popular de Urbanização que foi premiado internacionalmente.
Em abril o prefeito assinou contrato com as moradoras e moradores garantindo a construção de casas e reurbanização de parte da área da Vila. As 20 vitoriosas famílias contempladas pelo projeto aguardam a entrega das moradias permanentes, morando em casas provisórias construídas no próprio local. Essa foi uma das exigências das famílias, que deixa clara a sua desconfiança em relação ao poder público e a convicção de manter a luta até o fim.
A comunidade conhece seus direitos e os exige através de inscrições nos tapumes, paredes e muros das casas que restam. As ruas da Vila são ornados com denúncias, legislação e gritos de ordem de quem está decidido a resistir. Na Vila Autódromo essa luta é protagonizada por mulheres, e foi com elas que a Anú conversou e conheceu um pouco da situação da comunidade logo antes de ser assinado o acordo com a Prefeitura.
por Jonas Lunardon e Yamini Benites