A água baixa, as desigualdades aumentam
Após as enchentes no Rio Grande do Sul, às vésperas das eleições municipais, há eleitores de Porto Alegre que ainda estão vivendo o mês de maio e que acreditam que as ações das autoridades estão aquém da realidade da tragédia
Em 2023 o Rio Grande do Sul foi recordista dos decretos de emergência relacionados às chuvas. Os eventos extremos climáticos estão se agravando e o estado é o mais afetado no Brasil. Após as enchentes de maio de 2024 e às vésperas das eleições municipais, ainda há cidadãos porto-alegrenses convivendo com as consequências da tragédia.
Cinco meses após as enchentes, enquanto parte da população se prepara para ir às urnas no domingo (06), encontramos quem recém conseguiu retornar para casa, quem segue acampado na BR-290 e quem segue em abrigos do poder público. No Centro Humanitário de Acolhimento (CHA) Vida, no bairro Rubem Berta , onde a Agência da Organização das Nações Unidas (ONU) para as Migrações (OIM) faz a gestão, ainda vivem 358 pessoas.
“Já enfrentei umas quatro enchentes, mas essa foi maior. Saí com a água na canela, mas depois tive que ir até a ponte do Guaíba para me salvar”
conta o aposentado Ademir Soares, que trabalhava como vendedor e com o conserto de guarda-chuva. Ele segue acampado com a família na BR-290 próximo à casa onde vivia.
Diante do despreparo das autoridades frente à emergência climática, sentem e enfrentam diretamente o que a ausência de políticas públicas e a negligência na manutenção de sistemas de proteção podem ocasionar na vida das pessoas e da cidade. Segundo a Confederação Nacional dos Municípios, apenas 22% dos gestores municipais sentem que estão preparados para lidar com as mudanças climáticas. Durante os últimos cinco meses, isso ficou evidente na demora no cadastramento das famílias e liberação de recursos, na estrutura de abrigos e na falta de orientação sobre as atribuições de cada esfera de governo.
Demora que segue gerando angústia em quem aguarda seu nome ser contemplado nos projetos de moradia popular, na reconstrução de moradias, na solução para o sistema de saneamento e de obras nos diques de proteção.
Em 23 de setembro, o Sul21 mostrou que moradores do bairro Sarandi, maior colégio eleitoral da cidade, fizeram um protesto em frente à Prefeitura. O bairro está há mais de 120 dias sofrendo as consequências das enchentes de maio e esperando por respostas de todas as esferas de governo para voltar à “normalidade”.
Racismo ambiental
O alerta também é sobre o impacto que a emergência climática representa para a democracia, já que as desigualdades sociais aumentarão decisivamente e impactarão de forma desproporcional as mesmas populações de sempre.
O Bairro Arquipélago, um dos mais atingidos pela enchente de maio, tem o menor IDh da cidade. Em algumas ilhas, a pesca está entre as fontes de renda mais importantes. Entre os habitantes pertencentes a povos tradicionais na região, 44,89% são pescadores artesanais. Em uma série de reportagens pós-enchente no Rio Grande do Sul, o Nonada Jornalismo demonstrou como o racismo ambiental opera na prática.
Segundo a organização SOS Mata Atlântica, 72% da população brasileira mora no bioma Mata Atlântica. Entre as pautas que deveriam estar nas eleições municipais são propostas como desenvolver planos municipais de adaptação à mudança do clima, recuperar e proteger áreas de preservação permanente e fortalecer órgãos de meio ambiente no município.
Oito em cada dez brasileiros, estão preocupados com a mudança do clima, e 71% dos entrevistados percebem que, com o passar do tempo, os eventos climáticos extremos estão ficando cada vez mais frequentes e intensos (EBC).
Reportagem: Gabrielle de Paula Fotos: Yamini Benites